sexta-feira, 12 de julho de 2013

DE CURANDEIROS a DEMONIOS



As supostas bruxas (80 por cento das vítimas eram do sexo feminino) não eram como aquelas velhas corcundas e desdentadas que preparam poções nos contos infantis. Aos olhos de leigos e clérigos, estas damas diabólicas pertenciam a uma poderosa organização que trabalhava sem descanso para subverter a religião e pôr fim ao reino de Deus. A brutal mudança de percepção surgiu no Renascimento. Anteriormente, os bruxos faziam parte da rede social e “a feitiçaria correspondia ao desejo de dominar a Natureza em quatro aspectos principais: a saúde, o sexo, o conhecimento do futuro e a ambição económica”, afirma Joseph Pérez, historiador da Universidade de Bordéus (França). Habituais no meio rural, os feiticeiros desempenhavam o papel de curandeiros, dada a escassez de médicos, e viviam da venda de poções naturais e amuletos da sorte. Sem preparação intelectual, os seus conhecimentos sobre as plantas decorriam da tradição e da experiência; eram autênticos depositários da cultura popular.
Porém, tudo isso mudou no século XV. A Europa fora arrasada pela peste negra e, em 1494, surgiu uma nova epidemia que iria atingir um milhão de cidadãos: a sífilis. Entretanto, reis e governantes mergulhavam os seus países num ciclo constante de conflitos. À Guerra dos Cem Anos (1337–1453), entre a França e a Inglaterra, seguiram-se sangrentos confrontos entre católicos e protestantes e a Guerra dos Trinta Anos, que devastou a Euro

pa Central entre 1616 e 1648. A tudo isso é preciso somar períodos de seca e de fome, óbitos por falta de higiene, etc... Um cenário desolador para uma população dominada pelo receio de penúrias e desastres aparentemente sem explicação.
Nesse contexto, a Reforma religiosa serviu de trampolim para eliminar os vestígios de paganismo que subsistiam no meio rural e serviam de alimento à feitiçaria. Em vez de reciclar as velhas crenças, como fez o cristianismo primitivo, tanto católicos como protestantes decidiram atacá-las e declará-las uma herança de Satanás. Lutero defendeu que se queimasse os seus praticantes, e os luteranos estenderam por toda a Alemanha
a caça à bruxas, enquanto o calvinismo impôs na Escócia, em 1563, a primeira lei antibruxaria.

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